10/08/11

Asas


Era um dia igual a tantos outros.
A mãe preparava a refeição para saciar a família enquanto o petiz por ali cirandava entre a cozinha e o quarto brincando alegremente.
Da cozinha podia ouvi-lo em animados diálogos com os seus amigos imaginários, presença sempre constante na vida familiar.
De repente, algo desviou a atenção da mãe. Um piar aflitivo vindo do pequeno quintal anexo à cozinha.
Limpou as mãos e foi ver a que se devia tão aflitivo chamamento.
Um pequeno pardal, que mal sabia ainda usar as asas, esvoaçava pelo pequeno tufo de cactos de folha larga tentando a todo o custo equilibrar-se e  lançando  aqueles pios lancinantes chamando pelos pais que deveriam andar por perto.
Aos gritos acudiu também o menino e vendo o pequeno pardal disse de imediato:
- Mãe vamos arranjar uma gaiola e ficamos com ele sim?
A mãe encarou-o muito séria e disse-lhe:
- Gostavas que te fechassem numa gaiola? Vamos arranjar-lhe uma caixinha com lã como se fosse um ninho, vamos alimentá-lo, dar-lhe água e deixá-lo livre. Os pais devem andar perto. Vão ajudá-lo a fortalecer as asas e ensiná-lo a voar.
Quando chegar a hora e ele estiver preparado irá, voando com o resto da sua família e ganhando os céus, livre!
- Ó mãe mas assim ficamos sem ele, disse a criança fazendo uma carinha triste.
- Não perdemos o que nunca foi nosso, meu filho. Nosso é apenas o que fizermos pela vida fora. Não te esqueças disso. Um dia, também tu ganharás asas e voarás como o passarinho.
- Ganho asas? –perguntou o menino substituindo o ar entristecido por um ar muito admirado.
- Sim, ganhas. Um dia vais ter um lindo par de asas, e vais usá-las para realizar os teus sonhos e voares,  livre como os pássaros, saindo do ninho.
Nos dias que se seguiram mãe e filho divertiram-se a alimentar o pequeno pardal que passava os dias nas folhas do cacto e na mão da mãe do menino, onde ficava muito quietinho olhando o céu, e à noite dormia no ninho improvisado.
Certo dia, observaram outros pardais, com aspecto adulto, virem alimentar o pequeno pardal fazendo pequenos voos até ao cimo do muro do quintal incentivando-o a voar.
- Um dia destes o passarinho vai embora, filho – disse a mãe preparando a criança para o inevitável.
- Eu sei mãe. Não faz mal. Já me explicaste que ele tem asas para as usar e voar livre, que um dia também eu terei as minhas. Irei e serei como ele. Quem sabe ainda nos encontramos, não é? Mas tenho medo que fiques triste.
A mãe sorriu levemente dizendo que a obrigação dos pais é ajudar a que os filhos criem asas e as saibam usar. Nessa altura é chegada a hora de largar o ninho e treinar os voos. A mãe não ficava triste.
Como já era esperado o passarinho começou a ganhar confiança, trepou primeiro apenas até ao primeiro ramo da nespereira e caiu. No segundo dia, ganhou um pouco mais de céu. Assim continuou sempre incentivado pelos adultos, até que conseguiu ganhar asas e voar até ao lado de lá do limoeiro onde os outros o aguardavam, felizes e saltitantes.
Mãe e filho ficaram a vê-lo desaparecer por entre os ramos, ervas secas e altas, sabendo que já seria capaz de ganhar os ares e voar livre, vencendo o medo.
Nessa noite, o menino sonhou que lhe tinha nascido um lindo par de asas…